Caderno de mágoas foi o que um amigo recebeu após se separar. A ex anotara tudo o que a entristecera em oito anos de casamento. O detalhe curioso é que durante todo o período do relacionamento, nunca o casal teve qualquer desentendimento.
Sabe aquela dupla que todos os amigos invejam? Que são cúmplices, parceiros, bem resolvidos, bem sucedidos profissionalmente, viajados, cultos. Qual não foi a surpresa quando os dois anunciaram a separação. Todos os amigos ficaram de queixo caído ao receberem a notícia.
Pior ainda foi quando, tempos depois, soubemos pelo meu amigo sobre o tal caderno de mágoas. A figura teve o capricho de anotar dia, horário e local onde qualquer situação de mal estar tenha ocorrido. E foi listando uma por uma, numa interminável conversa de final de relação. Creio que nem mesmo Nelson Rodrigues seria capaz de imaginar algo tão inusitado.
Com a leitura de cada item, meu amigo foi ficando atordoado. Se eu sofri só de saber, imagine ele que viveu. Outro detalhe: eram coisas banais, comezinhas, mesquinhas mesmo, entende?
Você ficar se remoendo por causa desses acontecimentos só gera tristeza e, acredite, doença. Não é possível que alguém em plena consciência seja capaz de tamanha mesquinharia.
Guardar e registrar os “deslizes” da outra pessoa coloca você numa situação presunçosa, como se fosse estivesse incólume a falhar, e também ridícula porque revela a imaturidade e que você não enxerga, nem valoriza a relação que possui.
Como eu disse neste vídeo aqui, todos temos falhas. Por que razão o outro precisa ser perfeito? Esta ilusão só traz sofrimento. Quando alguém – nem precisa ser a pessoa com quem você se relaciona (não vou dizer amor porque acho que isso está longe deste sentimento tão nobre) fizer algo que lhe desagrade, converse na hora. Grite, xingue, esperneie.
Só não registre isso. Pode virar uma doença grave, se é que já não virou.